Para Antonia Marina Faleiros, que completa 18 anos de magistério no TJ-BA em dezembro, o racismo está "na formação da nossa mentalidade"

Juíza Antonia Marina Faleiros

Ex-empregada doméstica, a juíza Antonia Marina Faleiros, de 57 anos, completa neste mês 18 anos de magistério no Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA). Para ela, que já trabalhou em lavoura e morou na rua, o “discurso da meritocracia liberal é perverso”.

“Eu não sou uma iluminada, uma pessoa com estrela diferente. Não tenho nenhum componente que me diferencie das pessoas. Talvez eu tenha ficado mais noites sem dormir em relação às pessoas ao meu redor, mas isso é a desigualdade”, diz a juíza, em entrevista a Lucas França, da revista Época.

“Pregar que não é necessário nenhum tipo de apoio, nenhum tipo de ação que consiga compensar as desigualdades é extremamente perverso. Eu digo que este discurso é somente uma cortina para aplacar a consciência de quem fecha as portas, de quem não estende as mãos, de quem nega solidariedade”, completa.

A juíza pensa em “retribuição” quando olha para a sua trajetória como mulher negra e juíza. Para ela, pessoas parecidas com a realidade que teve devem buscar maneiras de fazer com que minorias também cheguem a lugares de poder.

“Temos a obrigação de nos fazermos visíveis como representações sociais positivas, capazes de estimular e incentivar as novas gerações. Dizer ‘estou aqui, estamos aqui, somos visíveis, temos esse espaço, há juízes negros’. A negritude tem um fator de exclusão muito forte no nosso país, há racismo embora disfarçado de piada, mas ele está na formação da nossa mentalidade”, afirma Antonia.

“Cada vez que for possível desconstruir o discurso, faça. As pessoas dizem que não são racistas, mas acham estranho ter juiz negro, médico negro. Elas são racistas sim”, completa.

Antonia se formou em Direito em 1991 e se tornou juíza no TJBA em 2002. Para ela, o país hoje vive um momento que é importante. “Uma sociedade é rica com quanto mais diversidade tiver. Devemos agregar mais riqueza”, reforça.